A participação de ultraprocessados na alimento dos brasileiros mais que dobrou desde os anos 80, passando de 10% para 23%. O alerta vem de uma série de artigos publicados nesta terça-feira (18) por mais de 40 cientistas, liderados por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP).
A coletânea publicada na revista Lancet mostra que nascente não é um fenômeno solitário do Brasil. Dados de 93 países mostram que o consumo de ultraprocessados aumentou ao longo dos anos em todos, à exceção do Reino Unificado, onde se manteve inabalável em 50%. O país europeu só é superado nessa proporção pelos Estados Unidos, onde os ultraprocessados perfazem mais de 60% da dieta.
Carlos Monteiro, pesquisador do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens) da USP e líder do trabalho, alerta que esse consumo crescente está reestruturando as dietas em todo o mundo, e não ocorre por contingência:
”Essa mudança na forma uma vez que as pessoas se alimentam é impulsionada por grandes corporações globais, que obtêm lucros extraordinários priorizando produtos ultraprocessados, apoiadas por fortes estratégias de marketing e lobby político que bloqueiam políticas públicas de promoção da alimento adequada e saudável.”
Em trinta anos, esse consumo triplicou na Espanha e na Coreia do Setentrião, alcançando índices de aproximadamente 32% também na China, onde a participação dos ultraprocessados nas compras familiares era de exclusivamente 3,5% passando a 10,4%. Já na Argentina, o aumento foi menor, ao longo do mesmo período, mas saiu de 19% para 29%.
Os artigos destacam que o aumento foi percebido nos países de baixa, média e subida renda, sendo que os últimos já partiram de patamares altos, enquanto as nações com renda menor registraram altas mais expressivas.
De contrato com os pesquisadores, isso reproduz um padrão percebido também dentro dos países: os ultraprocessados começaram a ser consumidos por pessoas de maior renda, mas depois se espalharam entre outros públicos.
Os pesquisadores ressalvam, no entanto, que o problema é multifatorial, influenciado pela renda, mas também por questões culturais. Alguns países de subida renda têm taxa de consumo significativo, uma vez que o Canadá, com 40%, enquanto outras nações, com padrão semelhante, uma vez que Itália e Grécia se mantém inferior de 25%.
O relatório lembra que esses produtos passaram a ser comuns em alguns países de subida renda em seguida a Segunda Guerra Mundial, mas se tornaram um fenômeno global, e seu consumo se acelerou, a partir da dez de 80, com a globalização. Em paralelo, também cresceram as taxas globais de obesidade e de doenças uma vez que diabetes tipo 2, cancro colorretal e doença inflamatória intestinal.
As evidências científicas produzidas ao longo desse tempo apontam que dietas ricas em ultraprocessados estão associadas à ingestão excessiva de calorias, pior qualidade nutricional e maior exposição a aditivos e substâncias químicas nocivas. Outrossim, os pesquisadores fizeram uma revisão sistemática de 104 estudos de longo prazo e 92 deles relataram risco aumentado de uma ou mais doenças crônicas, incluindo cancro, doenças cardiovasculares e metabólicas.
“O conjunto das evidências apoia a tese de que a substituição de padrões alimentares tradicionais por ultraprocessados é um fator mediano no aumento global da trouxa de múltiplas doenças crônicas relacionadas à alimento”, explicam os cientistas. Eles dizem que a pesquisa sobre efeitos na saúde humana continuará, mas isso não deve atrasar as políticas e ações de saúde pública em todos os níveis “destinadas a restaurar, preservar, proteger e promover dietas baseadas em mantimentos integrais e em seu preparo uma vez que pratos e refeições, que já estão atrasadas”, enfatizam os cientistas.
O que são ultraprocessados?
O termo “ultraprocessados” começou a se popularizar, em seguida a geração da classificação novidade, por pesquisadores brasileiros, em 2009. Ela divide os mantimentos em quatro grupos, de contrato com o intensidade de modificação, em seguida passarem por processos industriais:
- Mantimentos não processados ou minimamente processados são vendidos em sua forma originário, ou exclusivamente em seguida qualquer processo que mantém sua estrutura básica, uma vez que refrigeração, fracionamentos, moedura, embalo e etc. Exemplos: frutas e legumes; carnes e peixes, grãos e cereais embalados.
- Ingredientes processados. São produzidos a partir de mantimentos in natureza e geralmente usados na preparação de outros mantimentos. Exemplos: óleo de soja, açúcar e sal.
- Mantimentos processados: São os produtos do grupo 1, adicionados a ingredientes do grupo 2 ou modificados através de métodos semelhantes aos caseiros. Por exemplo: legumes e peixes enlatados, macarrão, sucos 100% feitos com frutas e etc.
- Mantimentos ultraprocessados: produtos comerciais resultantes da mistura de mantimentos in natureza baratos com aditivos químicos, altamente modificados por processos industriais. Esses aditivos têm a função de torná-los altamente duráveis, prontos para consumo e super palatáveis. Exemplo: biscoitos recheados, refrigerantes, macarrão momentâneo e iogurtes saborizados.
A geração da classificação novidade também foi encabeçada por Carlos Monteiro, líder do relatório global publicado nesta terça-feira. Ele reforça que o objetivo da classificação é facilitar o entendimento sobre “uma vez que o processamento afeta a qualidade da nossa dieta e a nossa saúde” e contribuir para a geração de diretrizes, uma vez que o Guia Cevar da População Brasileira, criado pelo Nupens para o Ministério da Saúde, que incorporou a classificação novidade na sua segunda edição.
“Há 20 anos estudando as mudanças na produção de mantimentos no Brasil, ligadas ao aumento da obesidade, nós percebemos que o processamento de mantimentos tinha mudado de propósito. Deixou de ser para preservação de mantimentos e passou a ser a geração de substitutos para os mantimentos, feitos de ingredientes baratos e aditivos”, destaca.
Recomendações
Os pesquisadores também apresentam propostas para diminuir o consumo desses produtos e pedem que as grandes empresas sejam responsabilizadas pelo papel que desempenham na promoção de dietas não saudáveis. Uma das principais recomendações é que os aditivos usados, uma vez que corantes e aromatizantes, sejam sinalizados nas embalagens, assim uma vez que o excesso de gordura, sal e açúcar.
Outra medida considerada necessário é a proibição desses produtos em instituições públicas, uma vez que escolas e hospitais. Nesse ponto, o Brasil é citado uma vez que exemplo, por motivo do Programa Vernáculo de Alimento Escolar (PNAE) do Brasil, que vem reduzindo a oferta desses produtos e estabeleceu que 90% dos mantimentos oferecidos nas escolas devem ser frescos ou minimamente processados, a partir do ano que vem.
Os autores também propõem restrições mais rigorosas à publicidade, principalmente às que são direcionadas ao público infantil e destacam que, em paralelo a redução da oferta de ultraprocessados, é preciso aumentar a disponibilidade de mantimentos in natureza. Uma estratégia sugerida é a sobretaxação de determinados ultraprocessados para financiar mantimentos frescos destinados a famílias de baixa renda.
A série de publicações também reforça que o aumento no consumo desses mantimentos não é culpa de decisões individuais, mas responsabilidade das grandes corporações globais. De contrato com os autores, essas empresas utilizam ingredientes baratos e métodos industriais para reduzir custos, e impulsionam o consumo com marketing hostil e designs atraentes.
Com vendas anuais globais de US$ 1,9 trilhão, os ultraprocessados representam o setor mais lucrativo da indústria alimentícia. Esses lucros, segundo os pesquisadores “alimentam o prolongamento do poder corporativo nos sistemas alimentares, permitindo que essas empresas ampliem sua produção, influência política e presença de mercado, moldando dietas em graduação global.”
Manadeira: Dependência Brasil
